segunda-feira, agosto 22

A Criança Pequena é Religiosa.

As crianças trazem consigo uma confiança incondicional, só comparável, em intensidade, a mais profunda entrega religiosa. Isto pode ficar evidente, por exemplo, durante o exame de um bebê de três meses. A criança, já despida, está deitada sobre a mesa de exame; a mãe, ao lado, aguarda que o medico a examine e verifique " se tudo está em ordem".
Ele se dispõe a começar, quando percebe o modo como a criança lhe dirige os olhos bem despertos. Ele sente que este olhar penetra em seu âmago-para onde a criança olha? Quem ela deseja encontrar? Como é possível que possa dirigir um olhar tão prolongado, tão constante, tão aberto, diretamente aos olhos de um adulto estranho? Quando na vida iremos encontrar um olhar como este? Isto acontece no momento em que nos abrimos completamente a uma outra pessoa. O lactente, todavia, tem essa abertura diante de qualquer pessoa.O que se manifesta primeiro no olhar ficará evidente, nos anos subsequentes, também no restante do comportamento: a criança vai ao encontro do mundo sem inibições, assimila e imita com fervor tudo o que acontece ao seu redor. Isto revela uma emocionante "confiança primordial" e a infinita expectativa que o adulto fará por ela todo o necessário. Todos nós vivemos em nossa infância um período de entrega ilimitada como esse,tivemos essa "confiança primordial". Mais tarde, na vida, só surgirá novamente um relacionamento semelhante com o mundo sob a forma de uma qualidade de um caráter conquistada. Esta se evidencia quando alguém consegue entregar-se totalmente a alguma coisa, "doar-se" a uma tarefa, ou como devoção consciente a Deus e aos mundos angélicos. Quando conversamos a esse respeito com os pais, mostrando que as crianças pequenas agem como se o mundo fosse absolutamente bom, confiável e digno de ser imitado - em realidade "divino"- muitas vezes eles retrucam: "Não é bom esclarecer a criança, desde cedo que isto não é verdade? Que o mundo não é "sadio" e que precisamos nos defender-nos lutar e proteger-nos?" A pergunta é respondida por si mesma quando dirigimos o olhar aos olhos cheios de esperança das crianças. Elas próprias sano a resposta: "abrir os olhos a miséria e a desgraça do mundo só pode ter sentido quando a criança já dispõe das forças necessárias para lidar com tais problemas. A "abertura precoce" dos olhos provoca insegurança e fraqueza, e, mais tarde, dúvidas sobre o sentido da própria existência, de difícil superação.Em realidade, a pergunta dos pais deve ser: "O que podemos fazer para que essa confiança primordial no mundo não seja desiludida? Para que a criança sinta haver adultos a sua volta esforçando-se para que o mundo-também- seja bom? O que podemos fazer para que no decorrer de seu desenvolvimento ela adquira foças suficientes para lidar igualmente com aquilo que não é bom na vida?
Somente na infância existem a mãe e o pai fazendo,'como no paraíso' tudo por nós; eles cuidam de tudo o que precisamos e simplesmente nos amam porque existimos. Posteriormente, na vida, um relacionamento deste tipo com outra pessoa é muito raro; mas ele está oculto em cada um, sob a forma de anseio. No decorrer da vida, esse anseio pode vir a ser um critério para o desenvolvimento de uma capacidade de amar no qual se salienta o doar. Quanto mais conseguirmos propiciar impressões que não decepcionem a confiança primordial da criança, tanto mais esta qualidade de vida poderá ancorar-se sob forma de experiências, e, mais tarde, tornar-se uma meta interior e um fortalecimento de alma.
Diante de tais considerações, argumenta- se com freqüência que embora o assunto apresentado pareça razoável, é difícil ter confiança na existência em tempos presentes. Violência e medo, insegurança sociais e risco de guerras, destruição ambiental, poluição de grandes regiões da terra pela radioatividade e fracassos pessoais apresentam-se como ameaças existenciais.Entretanto, tão indiscutível quanto estas ameaças, é a experiência de que com cada olhar de uma criança algo olha para dentro de nossas vidas, anunciando outras realidades da vida e tocando a questão da nossa origem espiritual.
Vista desse modo, a religiosidade é algo que podemos aprender com as crianças pequenas. As vivências experimentadas no convívio com elas tocam num sentimento religioso comum a todos os seres humanos. Porque o acesso consciente a esse mundo nos é tão dificultado - mesmo hoje em dia, quando o anseio da humanidade por uma ligação verdadeira com o mundo espiritual é formulado novamente com maior intensidade e existe tanta literatura sobre questões esotéricas?


Fonte: CONSULTÓRIO PEDIÁTRICO - W. Goebel e M. Glöckler
Pag- 433 /434

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